domingo, 14 de setembro de 2014

Fui saber se alguém falava
Uma outra voz além da tua
Após as estrelas.
E fui, após as estrelas,
Muito além depois da Lua
P'ra escutá-la.

Nada dizia essa outra voz
Que se pensava mais que a tua,
Hoje, ao deitar-se.
Foi no silêncio que prendi
Esse teu corpo, de mim nua
A apoderar-se.

E as vezes que me ouviu cantar
Foram, sim, poucas
A julgar que te encantava.
Mesmo que encante o teu pesar,
Sabendo-me capaz de amar,
Já eu te amava.

Não peques por te engrandeceres,
Estas palavras nada são
De madrugada.
A rima vai desvanecer,
E o encanto desaparecer,
Não vão ser nada.

Permie-me antes que te diga
Que aquilo que me castiga
Nada mais é que onda parada,
Saudade que não foi sarada.

terça-feira, 8 de julho de 2014

Porque o direccionar de almas
É desperdício de tempo entre as nossas calmas,
E desassociação de ímpetos de amor.
Pois o que o calor traz
Não é mais que o que se faz
Depois do frio,
Pois, e eu só me rio do entretanto,
Que palavra mais gasta
No instante que se culpa.
Não se desculpam carinhos...
Sem que a ingenuidade lhes falte.
Vou perder o que joguei.
E ganhar tudo o que não sei,
Já sem o ler,
E escrevê-lo sem nele crer
Não é amor,
É pudor à solidão
Que nos encanta, que nos espanta
O coração.
Dorme-me no frio, se me tens,
Que o calor em que não vens
Não me traz calma,
Destrói-me lentamente a alma.

quinta-feira, 26 de junho de 2014

Queda de anjo em pedra mole
Não me faz dura
Tempestade de quereres nas minhas feras.
Enfurecem-se ao relento as primaveras
Aguardando do amor as pobres curas.
Se adoeço em não querer, quero-te tanto,
Oh possível do entretanto
Em mim, deveras.
Não me deixes falar tanto
Dessas feras,
Que o meu anjo não tem asa que as segure.
Sussurra-me tu de entre os teus segredos,
Ao ouvido, do amor, o que me cure.
A minha sombra, essa,
Deixei-a pelo caminho à espera,
Do nascer do dia, no qual impera
A desavessa vontade do amor, Que me atravessa
Além do avesso em mim tropeça
Com furor.
E ao amanhecer, reza a loucura
Que a verdade, por mais pura,
Age ao pudor.
Fico-te à espera, amante,
Depois deste, um outro levante,
Que amanheça, entretanto,
Com fervor.

sexta-feira, 13 de junho de 2014

A seguir, ninguém ganha,
Ninguém sobe ao pedestal.
É tudo produto da mesma artimanha,
Filho bastardo do Reino Animal.
A seguir, derrubados amores,
Ninguém ganha o artifício,
Gastam-se vontades no ofício
Para não haver vencedores.

A seguir ao querer mais...
Do sonho, outro que tal,
Gasta-se o desassossego,
Toda a coragem, do medo,
E ninguém ganha, afinal.

terça-feira, 10 de junho de 2014

Deixem rogar pragas a quem reza ao esquecimento,
Só dele se não liberta quem tem medo.
As orações que escrevem que se fiquem cá na Terra,
Que o céu não preza por quem dele se liberta.
O esquecimento vem cedo,
Não te mintas, o esquecimento vem cedo.

domingo, 8 de junho de 2014

Não quis escrever poesia, de todo.
Hoje deixo-a no meu grande modo
Do não sentir, perdida.
E a rima da euforia desmedida
É o teu lema, não o meu.
Nem sequer é meu o tema, a cor, ou o céu,
E porque não quis escrever, de todo, poesia.

Tanta gente inventa, tanta gente tenta,
E eu sinto-me tentada a não tentar,
Escorrega-me a tinta na tela atenta
Do nem sequer querer pensar.

Bendito cansaço que me segura
A impertinência de me mandar mais que eu.
A minha mão é indecência pura e crua,
Guarda a demência de tudo o que é meu.

Não quis escrever poesia, não quero.
O que deixo aqui são restos de palavras.
Nem o amor, a raiva ou tudo o que é severo
Me consegue prender nessas amarras.

São vãs, caladas, e fugazes
As silenciosas presas das palavras.

sábado, 3 de maio de 2014

Também eu tenho os meus medos.
E achas que alguma vez daria, medos postos à parte?
Se à parte se partilhasse o impossível,
Em estradas paralelas seria invisível
O conforto longe dos medos.
Também eu tenho os meus medos,
E esperanças corrompidas
Nos meus credos.

Se te queres ficar, fica-te.
Os meus tardes serão os teus cedos.

domingo, 27 de abril de 2014

Saudades nem sei do quê,
Não sei quem mente nem sei quem lê,
Importantemente nada importa
Ao inconsciente que se eleva,
Nem ele sabe quem o leva.

Saudades, porquê?
Do que antes pisei ficou a marca do sapato no meu pé
Inconscientemente, o que mente a saudade?
Não é ela decerto a verdade, não é ela decerto quem vê...
O que o meu coração sente.

Detesto dar poemas à saudade.
A saudade inventa-se,
E ao peito que é indiferente,
Dá-se saudade.
E a saudade alimenta-se,
Parasita do coração.
Deixa-me por antes os pés assentes no chão.
Braga, 23 de Abril de 2014

Para que o coração se apague como vela acesa em chuva,
Não tolero a força só de não ter como o inventar.
É o castigo mais carente, água estagnada mas turva,
De um mar que deixou a praia p'ra não ter que a inundar.
E foi para longe da chuva que se perde na corrente,
Porque chover sem destino é ter tudo e nada para amar.
Braga, 23 de Abril de 2014
 
Se calhar caír o céu nestas estribeiras,
Pairante no conforto de o não ver
Serei eterna efémera ardente onde semeia
A vontade que não tem de em mim crescer.

Configuram-se castigos onde o tempo em si tropeça,
Da alegria que na aparição presente
Se corroi, tal é o pranto que começa
No fim onde fala o peito e a voz mente.
...
Supremacia que é quente e me ligeira
O pensamento que bate sem se ler,
Já não sei escrever então dessa lareira
O frio que em mim se abate sem crescer.

E procria o amor-perfeito em flor vibrante,
Com carinhos que nele mal me fazem crer
Para deixar vestígios secos de uma amante
Que há escondida algures à espera de nascer.
Lamego, 20 de Abril de 2014

Quando vieres buscar o amanhã
Pergunta-me se o tenho comigo,
Reles, o futuro bandido
Onde te afundas.
Reza-se intrometido nas incertezas,
Incapaz de me consertar.

Quando vieres buscar o ontem
Que te devo,
Não estarei mais lá....
Fico-me antes por cá, onde te afundas,
E onde vens buscar o amanhã
Do qual te dizes amigo,
Deixa-te, ele fugiu antes comigo.

Quando vieres buscar o hoje,
Deixa-te pelo caminho,
É comigo que ele foge.
E o que queres tu do meu destino?
Não percas tempo em busca do amanhã,
Ele fugiu ontem comigo, chegou hoje de manhã.

sábado, 12 de abril de 2014

Não fui ao mar para te pedir que me contes os meus sonhos, largados na areia em estilhaços de vidro.
Fui para lavar os meus desejos ocultos de te ter, e sem querer cuspiste-lhes mais uma onda para os afogar. Fui sem volta na revolta de querer sair, e aos passos pequenos decidi que não viria de novo para te ver, se é que sei ver na cegueira de castigos incultos que me prometo. O que foi descansado de grãos de areia remotos chega ao céu já sem sal, e todo o seu mal inunda o mar aonde fui para lavar os despojos de quereres irretribuíveis.
Subi as dunas, sequei os pés, e tudo o que foi sentimento está agora rés-bés ao chão que piso. E piso até arrebatar a pedra da calçada que o constrói de fora e me pesa, porque pesa. Ficam as culturas sem sustento e os poemas sem momento e os olhares já se evitam. Não perguntei porquê, levantei-me do chão, e andei de volta ao mar, onde não fui para que me contes os meus sonhos.

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Quem será o dono dos nossos demónios?
Serão eles amestrados por corpos sem valores,
Desesperos, ardores,
Quem será?
Começamos intérpretes do momento,
Saliva, suores, unguento,
Mas quem nos os será?
Vêm os tempos sangrentos,
Para nos deixar perdidos,
E vivemos atentos,...
Apaziguando os desconfortos
Dos nossos demónios,
Que ninguém tem.


Ofereço os meus demónios
A quem os souber guardar.
Que lhes dê um bom nome,
Que lhes faça um carinho,
Que lhes cure a dor.
Soltando-os do seu criador,
Que lhes construa um castelo,
Bem longe, bem longe de mim,
Que ponha aos meus demónios
Um fim.

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Desenha-me outra vez
Mas não me toques,
Não me toques.
Que o sentir já se fez ledo,
Dono demais dos meus quês.

Sou mais do que o que escrevo,
E nem o que escrevo lês.
Desenha-me outra vez,
Mas não me toques.

Ai, que inveja do passado!
Disse-me deusa do fado.
Fado meu, este cantado
Em silêncio mal amado
De querer sem querer
O meu coração afogado
De volta.
Mas já não volta.

Ai, que inveja do cansaço
De já não ser.
Fado meu, retorna do abraço
Onde me quero adormecer,
Do silêncio mal amado
Fazer amor aconchegado
De volta.
Se é que não volta.

Pedra encharcada ao meu caminho,
Leva-me ao desassossego
Que o medo do amor cego,
É o meu melhor carinho.
Deixa-me ficar no fado
Do silêncio mal amado,
Que a lágrima que carrego
Não é digna
Deste grito mal cantado.

Faz-me mulher deste fardo,
Alimenta-me a fome de castigo,
Que o fado é meu amigo.
(Faz-me esquecer o passado.)

quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Saturou-se o pouco tempo
Com águas lavadas, saudade.
Falta só mais um segundo
Para se afundar o mundo,
Paraíso da verdade.
E como queria mentir-mo!

Não se contam prosas sem versos
Onde há carinhos adversos,
E o texto onde desarmo o impassível
Lavado em terreno visível,
Submerso num mar de rosas,
Como queria mentir-me!

São uns a seguir aos outros,
Palavras, segredos loucos
Sentidos e coagidos,
Saturam-se os tempos poucos
Vivendo-me os vãos suspiros,
Como queria menti-los!

E escreve-se poesia
Coagulada, não lida,
E que inventada se cria,
Como queria menti-la,
Como queria senti-la,
Ai, poesia querida!